terça-feira, 11 de outubro de 2016

Teologia Sistemática 1 - aula 12 - Doutrina da Providência


TÓPICOS DA AULA
1. Definição
2. Preservação
3. Concorrência
4. Governo
5. Bibliografia


1. DEFINIÇÃO
Nesta última aula sobre Teologia Sistemática 1 aprenderemos um pouco sobre a Doutrina da Providência. Embora o termo “providência” não se encontre nas Escrituras Sagradas, seu significado pode ser facilmente notado em todas as suas páginas, por meio do relacionamento constante do Criador com sua criação.

“(...) Pode-se definir a providência como o permanente exercício da energia divina, pelo qual o Criador preserva todas as suas criaturas, opera em tudo que se passa no mundo e dirige todas as coisas para o seu determinado fim. (...)”[1]


Essa definição aponta três palavras que expressam o relacionamento do Criador com a criação: preservação, concorrência e governo. Não são três formas distintas de relacionamento, pois elas estão intimamente interligadas, sendo que cada uma delas compõe a totalidade da relação de Deus com o mundo. Essas três palavras servem mais para efeitos didáticos, a fim de facilitar nossa compreensão quanto à forma como o Senhor cuida de tudo aquilo que criou.

“(...) Desde o início, a preservação também é governo, governo é concorrência e concorrência é criação. A preservação nos diz que nada existe, nem uma só substância, e também nem um só poder, nenhuma atividade, nenhuma ideia, a menos que exista totalmente a partir de Deus, por meio dele e para ele. A concorrência torna conhecida a nós a mesma preservação como uma atividade que, em vez de suspender a existência das criaturas, acima de tudo a assegura e sustenta. O governo descreve os outros dois aspectos como guiando todas as coisas de tal modo que o objetivo final determinado por Deus seja alcançado. E sempre, do começo ao fim, a providência é um poder simples, todo-poderoso e onipotente. (...)”[2]


As Escrituras estão repletas de textos que afirmam a soberania divina sobre toda a criação, seu interesse e seu cuidado constantes por ela.

Pois nele vivemos, e nos movemos, e existimos, como alguns dos vossos poetas têm dito: Porque dele também somos geração. At 17.28

Porque dele e por meio dele e para ele são todas as coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém. Rm 11.36

O SENHOR olha dos céus; vê todos os filhos dos homens; do lugar de sua morada observa todos os moradores da terra, ele que forma o coração de todos eles. Sl 33.13-15


2. PRESERVAÇÃO
A doutrina da preservação nos ensina que Deus é o único responsável pela manutenção da existência da criação. Tudo que existe somente permanece em existência pela obra constante do Criador. Se Deus não preservar alguma criatura, ela imediatamente deixará de existir. Apesar de ter sua existência distinta de Deus, no sentido de não ser o próprio Criador, a criação depende total e exclusivamente Dele para continuar a existir.

“(...) A preservação pode ser definida como a obra contínua de Deus pelo qual ele mantém as coisas que criou, juntamente com as propriedades e poderes de que as dotou. (...)”[3]


Neste ponto, cabe afastar um grave erro de interpretação dessa doutrina, qual seja, que a preservação não é meramente negativa, ou seja, ela não significa apenas que Deus não destrói aquilo que criou. Esse raciocínio, defendido pelos deístas, é irracional, pois implica que Deus criou algo que pode subsistir independentemente da Sua ação, algo “autossustentável”; se isso fosse verdade, Deus não seria soberano, e, portanto, não seria Deus; é irreligioso, porque afasta a criação do Criador, impossibilitando o relacionamento entre ambos; é antibíblico, porque nega o constante cuidado de Deus com tudo que Ele mesmo criou.

Seguem alguns textos bíblicos a respeito da preservação divina:

Só tu és SENHOR, tu fizeste o céu, o céu dos céus, e todo o seu exército, a terra e tudo quanto nela há, os mares e tudo quanto há neles; e tu os preservas a todos com vida, e o exército dos céus te adora. Ne 9.6

Não se vendem dois pardais por um asse? E nenhum deles cairá em terra sem o consentimento de vosso Pai. E quanto a vós outros, até os cabelos todos da cabeça estão contados. Mt 10.29-30

Eis que eu estou contigo, e te guardarei por onde quer que fores, e te farei voltar a esta terra, porque te não desampararei, até cumprir eu aquilo de que te hei referido. Gn 28.15


A preservação decorre da soberania divina. Deus é soberano, e isso significa que Ele tem total poder sobre toda a criação. Tudo que existe depende do Criador para continuar existindo, não há nada nem ninguém em toda a criação totalmente livre ou independente, no sentido de não depender de Deus. Além disso, a vontade do Senhor é sempre efetuada, nada acontece independentemente do Seu querer.


3. CONCORRÊNCIA

“(...) Pode-se definir a concorrência como a cooperação do poder divino com todos os poderes subordinados, em harmonia com as leis pré-estabelecidas de sua operação, fazendo-os agir precisamente como agem. (...)”[4]


De imediato, podemos aprender duas verdades contidas neste conceito da concorrência divina:

a) As forças pré-estabelecidas, conhecidas como “forças da natureza”, não existem independentemente de Deus, mas foram criadas por Ele exatamente da forma como existem. Por semelhante modo, essas forças não atuam livremente, mas estão total e constantemente subordinadas à vontade divina. Elas foram criadas e atuam em conformidade com os propósitos do Criador.

b) Somente existe “concorrência” porque duas ou mais causam atuam conjuntamente, no caso, Deus e as criaturas. Isso nos leva a concluir que as criaturas também possuem certo poder de ação dentro do Universo, e é este o fundamento para defender sua responsabilização, positiva ou negativa, pelas consequências dos seus atos.

As Escrituras atestam essas afirmações:

Agora, pois, não vos entristeçais, nem vos irriteis contra vós mesmos por me haverdes vendido para aqui; porque para conservação da vida, Deus me enviou adiante de vós. Gn 45.5

Respondeu-lhe o SENHOR: Quem fez a boca do homem? Ou quem faz o mudo ou o surdo, ou o que vê, ou o cego? Não sou eu, o SENHOR? Vai, pois, agora, e eu serei com a tua boca, e te ensinarei o que hás de falar. Ex 4.11-12

Tu falarás tudo o que eu te ordenar; e Arão, teu irmão, falará a Faraó, para que deixe ir da sua terra os filhos de Israel. Eu, porém, endurecerei o coração de Faraó, e multiplicarei na terra do Egito os meus sinais e as minhas maravilhas. Ex 7.2-3

Como ribeiros de águas, assim é o coração do rei na mão do SENHOR; este, segundo o seu querer, o inclina. Pv 21.1


A concorrência divina nos ensina que não há nenhum ato das criaturas totalmente independente de Deus. É o Criador quem capacita e energiza as criaturas a agirem. É Ele também quem acompanha as criaturas em suas ações, de forma que sempre atinjam seus propósitos santos, justos e bons.

E há diversidade nas realizações, mas o mesmo Deus é quem opera tudo em todos. 1Co 12.6

nele, digo, no qual fomos também feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade. Ef 1.11

porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade. Fp 2.13


A grande objeção que sempre é colocada contra a doutrina da concorrência divina é que ela destrói a responsabilidade humana. Já enfrentamos essa questão quando tratamos da vontade e dos decretos divinos (Aula 08), pelo que cabe apenas relembrar os dois pontos principais que elucidam quaisquer dúvidas: 1- as Escrituras não veem contradição entre as duas questões; em que pese agirem motivados e capacitados por Deus, os homens são sempre responsabilizados por seus atos, quer sejam bons, quer sejam maus; 2- o conceito de liberdade humana é ilusório, pois a Queda afetou gravemente todas as faculdades do homem e tornou o homem escravo do pecado. Não foi a concorrência divina que retirou do homem sua “liberdade”, mas sim o pecado.

A concorrência divina também não torna Deus o autor do pecado, conforme brevemente exposto na Aula 08 e transcrito abaixo:

O decreto divino em relação ao pecado é costumeiramente denominado como permissivo, no sentido de que Deus tornou as ações do homem infalivelmente certas de acontecerem, sem agir de forma positiva no homem. O decreto torna certa a realização do ato pecaminoso, no qual Deus decidiu não impedir a determinação pecaminosa do homem e decidiu regular os efeitos dessa atitude humana. Deus criou o homem como um ser moral livre, e o homem utilizou-se dessa liberdade para pecar, sendo, portanto, o homem o único autor do pecado.

“(...) O problema da relação de Deus com o pecado continua sendo um mistério para nós, mistério este que não somos capazes de resolver. Pode-se dizer, porém, que o seu decreto de permitir o pecado, embora assegure a entrada do pecado no mundo, não significa que ele tem prazer nele; significa somente que ele considerou sábio, com o propósito da sua autorrevelação, permitir o mal moral, por mais detestável que seja a sua natureza. (...)”[5]

“(...) O concurso divino dinamiza o homem e o determina eficazmente ao ato específico, mas é o homem que dá ao ato a sua qualidade formal e que, portanto, é responsável por seu caráter pecaminoso. (...)”[6]


4. GOVERNO

“(...) Pode-se definir o governo divino como a contínua atividade de Deus pela qual ele rege todas as coisas teleologicamente a fim de garantir a realização do propósito divino. (...)”[7]


Essa doutrina revela Deus como o grande rei que governa o Universo conforme seus propósitos. Ao contrário das afirmações de alguns teólogos, Deus não deixou de ser o grande Rei do Antigo Testamento para tornar-se apenas o Pai amoroso do Novo Testamento. Ele sempre foi e continua sendo tanto Rei como Pai e deve ser servido e adorado desta forma por toda a criação.

Por aquele tempo exclamou Jesus: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos pequeninos. Mt 11.25

O Deus que fez o mundo e tudo o que nele existe, sendo ele Senhor do céu e da terra, não habita em santuários feitos por mãos humanas. At 17.24

Assim, ao Rei eterno, imortal, invisível, Deus único, honra e glória pelos séculos dos séculos. Amém. 1Tm 1.17


O governo divino é universal, abrange todas as coisas, mesmo as mais insignificantes. Nada passa despercebido ou é desprezado por Deus. Todas as coisas ocorrem por sua vontade soberana e para alcançar seus objetivos, dos quais, o mais elevado, sem dúvida, é demonstrar sua gloriosa majestade às criaturas e conduzi-las à adoração sincera.

Deus é o rei de toda a terra, salmodiai com harmonioso cântico. Deus reina sobre as nações: Deus se assenta no seu santo trono. Os príncipes dos povos se reúnem, o povo do Deus de Abraão, porque a Deus pertencem os escudos da terra: ele se exaltou gloriosamente. Sl 47.7-9


5. BIBLIOGRAFIA

BAVINCK, Herman. Dogmática Reformada: volume 1; traduzido por Vagner Barbosa. São Paulo: Cultura Cristã, 2012.

BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática; traduzido por Odayr Olivetti. 4ª Edição Revisada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012.




[1] BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática; traduzido por Odayr Olivetti. 4ª Edição Revisada. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p.154.
[2] BAVINCK, Herman. Dogmática Reformada; traduzido por Vagner Barbosa. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, p. 617.
[3] BERKHOF, Louis. Idem., p.157
[4] BERKHOF, Louis. Idem., p.158
[5] BERKHOF, Louis. Idem., p. 102.
[6] BERKHOF, Louis. Idem., p. 161.
[7] BERKHOF, Louis. Idem., p. 161.

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