TÓPICOS DA AULA
1. Definição
2. Preservação
3. Concorrência
4. Governo
5. Bibliografia
1. DEFINIÇÃO
Nesta última aula sobre Teologia Sistemática 1
aprenderemos um pouco sobre a Doutrina da Providência. Embora o termo
“providência” não se encontre nas Escrituras Sagradas, seu significado pode ser
facilmente notado em todas as suas páginas, por meio do relacionamento
constante do Criador com sua criação.
“(...)
Pode-se definir a providência como o permanente exercício da energia divina,
pelo qual o Criador preserva todas as suas criaturas, opera em tudo que se
passa no mundo e dirige todas as coisas para o seu determinado fim. (...)”[1]
Essa definição aponta três palavras que expressam o
relacionamento do Criador com a criação: preservação, concorrência e governo.
Não são três formas distintas de relacionamento, pois elas estão intimamente
interligadas, sendo que cada uma delas compõe a totalidade da relação de Deus
com o mundo. Essas três palavras servem mais para efeitos didáticos, a fim de
facilitar nossa compreensão quanto à forma como o Senhor cuida de tudo aquilo
que criou.
“(...)
Desde o início, a preservação também é governo, governo é concorrência e
concorrência é criação. A preservação nos diz que nada existe, nem uma só
substância, e também nem um só poder, nenhuma atividade, nenhuma ideia, a menos
que exista totalmente a partir de Deus, por meio dele e para ele. A
concorrência torna conhecida a nós a mesma preservação como uma atividade que,
em vez de suspender a existência das criaturas, acima de tudo a assegura e
sustenta. O governo descreve os outros dois aspectos como guiando todas as coisas
de tal modo que o objetivo final determinado por Deus seja alcançado. E sempre,
do começo ao fim, a providência é um poder simples, todo-poderoso e onipotente.
(...)”[2]
As Escrituras estão repletas de textos que afirmam
a soberania divina sobre toda a criação, seu interesse e seu cuidado constantes
por ela.
Pois nele vivemos, e nos movemos, e existimos, como
alguns dos vossos poetas têm dito: Porque dele também somos geração. At 17.28
Porque dele e por meio dele e para ele são todas as
coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém. Rm 11.36
O SENHOR olha dos céus; vê todos os filhos dos homens;
do lugar de sua morada observa todos os moradores da terra, ele que forma o
coração de todos eles. Sl 33.13-15
2. PRESERVAÇÃO
A doutrina da preservação nos ensina que Deus é o
único responsável pela manutenção da existência da criação. Tudo que existe
somente permanece em existência pela obra constante do Criador. Se Deus não
preservar alguma criatura, ela imediatamente deixará de existir. Apesar de ter
sua existência distinta de Deus, no sentido de não ser o próprio Criador, a
criação depende total e exclusivamente Dele para continuar a existir.
“(...) A
preservação pode ser definida como a obra contínua de Deus pelo qual ele mantém
as coisas que criou, juntamente com as propriedades e poderes de que as dotou.
(...)”[3]
Neste ponto, cabe afastar um grave erro de
interpretação dessa doutrina, qual seja, que a preservação não é meramente
negativa, ou seja, ela não significa apenas que Deus não destrói aquilo que
criou. Esse raciocínio, defendido pelos deístas, é irracional, pois implica que
Deus criou algo que pode subsistir independentemente da Sua ação, algo
“autossustentável”; se isso fosse verdade, Deus não seria soberano, e,
portanto, não seria Deus; é irreligioso, porque afasta a criação do Criador,
impossibilitando o relacionamento entre ambos; é antibíblico, porque nega o
constante cuidado de Deus com tudo que Ele mesmo criou.
Seguem alguns textos bíblicos a respeito da
preservação divina:
Só tu és SENHOR, tu fizeste o céu, o céu dos céus, e
todo o seu exército, a terra e tudo quanto nela há, os mares e tudo quanto há
neles; e tu os preservas a todos com vida, e o exército dos céus te adora. Ne
9.6
Não se vendem dois pardais por um asse? E nenhum deles
cairá em terra sem o consentimento de vosso Pai. E quanto a vós outros, até os
cabelos todos da cabeça estão contados. Mt 10.29-30
Eis que eu estou contigo, e te guardarei por onde quer
que fores, e te farei voltar a esta terra, porque te não desampararei, até
cumprir eu aquilo de que te hei referido. Gn 28.15
A preservação decorre da soberania divina. Deus é
soberano, e isso significa que Ele tem total poder sobre toda a criação. Tudo
que existe depende do Criador para continuar existindo, não há nada nem ninguém
em toda a criação totalmente livre ou independente, no sentido de não depender
de Deus. Além disso, a vontade do Senhor é sempre efetuada, nada acontece
independentemente do Seu querer.
3. CONCORRÊNCIA
“(...)
Pode-se definir a concorrência como a cooperação do poder divino com todos os
poderes subordinados, em harmonia com as leis pré-estabelecidas de sua
operação, fazendo-os agir precisamente como agem. (...)”[4]
De imediato, podemos aprender duas verdades
contidas neste conceito da concorrência divina:
a) As forças pré-estabelecidas, conhecidas como “forças da natureza”, não existem independentemente de Deus, mas foram criadas por Ele exatamente da forma como existem. Por semelhante modo, essas forças não atuam livremente, mas estão total e constantemente subordinadas à vontade divina. Elas foram criadas e atuam em conformidade com os propósitos do Criador.
b) Somente existe “concorrência” porque duas ou mais causam atuam conjuntamente, no caso, Deus e as criaturas. Isso nos leva a concluir que as criaturas também possuem certo poder de ação dentro do Universo, e é este o fundamento para defender sua responsabilização, positiva ou negativa, pelas consequências dos seus atos.
As Escrituras atestam essas afirmações:
Agora, pois, não vos entristeçais, nem vos irriteis
contra vós mesmos por me haverdes vendido para aqui; porque para conservação da
vida, Deus me enviou adiante de vós. Gn 45.5
Respondeu-lhe o SENHOR: Quem fez a boca do homem? Ou
quem faz o mudo ou o surdo, ou o que vê, ou o cego? Não sou eu, o SENHOR? Vai,
pois, agora, e eu serei com a tua boca, e te ensinarei o que hás de falar. Ex
4.11-12
Tu falarás tudo o que eu te ordenar; e Arão, teu
irmão, falará a Faraó, para que deixe ir da sua terra os filhos de Israel. Eu,
porém, endurecerei o coração de Faraó, e multiplicarei na terra do Egito os
meus sinais e as minhas maravilhas. Ex 7.2-3
Como ribeiros de águas, assim é o coração do rei na
mão do SENHOR; este, segundo o seu querer, o inclina. Pv 21.1
A concorrência divina nos ensina que não há nenhum
ato das criaturas totalmente independente de Deus. É o Criador quem capacita e
energiza as criaturas a agirem. É Ele também quem acompanha as criaturas em
suas ações, de forma que sempre atinjam seus propósitos santos, justos e bons.
E há diversidade nas realizações, mas o mesmo Deus é
quem opera tudo em todos. 1Co 12.6
nele, digo, no qual fomos também feitos herança,
predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o
conselho da sua vontade. Ef 1.11
porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o
realizar, segundo a sua boa vontade. Fp 2.13
A grande objeção que sempre é colocada contra a
doutrina da concorrência divina é que ela destrói a responsabilidade humana. Já
enfrentamos essa questão quando tratamos da vontade e dos decretos divinos
(Aula 08), pelo que cabe apenas relembrar os dois pontos principais que
elucidam quaisquer dúvidas: 1- as Escrituras não veem contradição entre as duas
questões; em que pese agirem motivados e capacitados por Deus, os homens são
sempre responsabilizados por seus atos, quer sejam bons, quer sejam maus; 2- o
conceito de liberdade humana é ilusório, pois a Queda afetou gravemente todas
as faculdades do homem e tornou o homem escravo do pecado. Não foi a
concorrência divina que retirou do homem sua “liberdade”, mas sim o pecado.
A concorrência divina também não torna Deus o autor
do pecado, conforme brevemente exposto na Aula 08 e transcrito abaixo:
O decreto divino em relação ao pecado é
costumeiramente denominado como permissivo, no sentido de que Deus tornou as
ações do homem infalivelmente certas de acontecerem, sem agir de forma positiva
no homem. O decreto torna certa a realização do ato pecaminoso, no qual Deus
decidiu não impedir a determinação pecaminosa do homem e decidiu regular os
efeitos dessa atitude humana. Deus criou o homem como um ser moral livre, e o
homem utilizou-se dessa liberdade para pecar, sendo, portanto, o homem o único
autor do pecado.
“(...)
O problema da relação de Deus com o pecado continua sendo um mistério para nós,
mistério este que não somos capazes de resolver. Pode-se dizer, porém, que o
seu decreto de permitir o pecado, embora assegure a entrada do pecado no mundo,
não significa que ele tem prazer nele; significa somente que ele considerou
sábio, com o propósito da sua autorrevelação, permitir o mal moral, por mais
detestável que seja a sua natureza. (...)”[5]
“(...)
O concurso divino dinamiza o homem e o determina eficazmente ao ato específico,
mas é o homem que dá ao ato a sua qualidade formal e que, portanto, é
responsável por seu caráter pecaminoso. (...)”[6]
4. GOVERNO
“(...) Pode-se definir o governo divino
como a contínua atividade de Deus pela qual ele rege todas as coisas
teleologicamente a fim de garantir a realização do propósito divino. (...)”[7]
Essa
doutrina revela Deus como o grande rei que governa o Universo conforme seus
propósitos. Ao contrário das afirmações de alguns teólogos, Deus não deixou de
ser o grande Rei do Antigo Testamento para tornar-se apenas o Pai amoroso do
Novo Testamento. Ele sempre foi e continua sendo tanto Rei como Pai e deve ser
servido e adorado desta forma por toda a criação.
Por
aquele tempo exclamou Jesus: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra,
porque ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos e as revelaste aos
pequeninos. Mt 11.25
O
Deus que fez o mundo e tudo o que nele existe, sendo ele Senhor do céu e da
terra, não habita em santuários feitos por mãos humanas. At 17.24
Assim,
ao Rei eterno, imortal, invisível, Deus único, honra e glória pelos séculos dos
séculos. Amém. 1Tm 1.17
O
governo divino é universal, abrange todas as coisas, mesmo as mais
insignificantes. Nada passa despercebido ou é desprezado por Deus. Todas as
coisas ocorrem por sua vontade soberana e para alcançar seus objetivos, dos
quais, o mais elevado, sem dúvida, é demonstrar sua gloriosa majestade às
criaturas e conduzi-las à adoração sincera.
Deus
é o rei de toda a terra, salmodiai com harmonioso cântico. Deus reina sobre as
nações: Deus se assenta no seu santo trono. Os príncipes dos povos se reúnem, o
povo do Deus de Abraão, porque a Deus pertencem os escudos da terra: ele se
exaltou gloriosamente. Sl 47.7-9
5. BIBLIOGRAFIA
BAVINCK, Herman. Dogmática Reformada: volume 1;
traduzido por Vagner Barbosa. São Paulo: Cultura Cristã, 2012.
BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática;
traduzido por Odayr Olivetti. 4ª Edição Revisada. São Paulo: Cultura Cristã,
2012.