SOBERANIA DE DEUS
NA SALVAÇÃO
AULA 05
A DIVERGÊNCIA
ENTRE OS SEMIPELAGIANOS
E AGOSTINHO
TÓPICOS DA AULA
- Biografia de
João Cassiano
- Concepções do
semipelagianismo
- O Sínodo de
Orange
- Quadro
comparativo entre as doutrinas de Pelágio, Agostinho e Cassiano
BIOGRAFIA DE JOÃO CASSIANO
Nascimento: 360 (Cítia Menor)
Falecimento: 435 (Marselha, França)
* Cítia Menor é a atual Romênia
Recebeu formação religiosa em Belém e viveu no
Egito.
Foi ordenado diácono por João Crisóstomo, em
Constantinopla, e padre pelo papa Inocêncio, em Roma.
Em 415 fundou dois mosteiros em Marselha, um
exclusivo para homens e outro exclusivo para mulheres.
JOÃO CASSIANO E O
SEMIPELAGIANISMO
João Cassiano esforçou-se por demonstrar as
falhas dos conceitos de Agostinho a respeito da salvação. Ele procurou elaborar
uma alternativa tanto ao monergismo como ao pelagianismo, desenvolvendo um
sinergismo católico ortodoxo.
- Monergismo: é o poder sobrenatural de Deus
somente pelo qual é concedido ao homem a capacidade espiritual para cumprir as
condições do pacto da graça.
- Sinergismo: afirma que Deus atua
parcialmente e que a totalidade da salvação também depende da vontade de cada
ser humano para completar a obra divina e com isso unir-se a Deus de maneira
deliberada.
A proposta de João Cassiano ficou conhecida
como semipelagianismo e foi aceita por grande parte do catolicismo romano
medieval.
Resumo do pensamento de João Cassiano:
1. As concepções de Agostinho são novas e
representam um afastamento dos ensinos dos pais da igreja, especialmente
Tertuliano, Ambrósio e Jerônimo. O próprio Cassiano foi aluno de Crisóstomo.
2. O
ensino de Agostinho sobre a predestinação “mutila a força da pregação,
reprovação e energia moral,... imerge os homens no desespero”, e introduz “uma
certa necessidade fatal”.
3. As fortes concepções de Agostinho não são
necessárias para refutar as heresias de Pelágio e fugir delas.
4. Embora a graça de Deus seja necessária para
a salvação e assista a vontade humana no fazer o bem, é o homem, não Deus, quem
deve desejar o que é bom. A graça é dada “a fim de que aquele que começou a
desejar, seja assistido”, não para dar “o poder de desejar”.
5. Deus deseja salvar todas as pessoas e a
propiciação da expiação de Cristo está disponível a todos.
6. A predestinação baseia-se na presciência
divina.
7. Não há “um número definido de pessoas a
serem eleitas ou rejeitadas”, desde que Deus “deseja que todos os homens sejam
salvos, porém nem todos os homens são salvos”.
R. C. Sproul. Sola Gratia; traduzido por Denise Pereira Ribeiro Meister. São
Paulo: Cultura Cristã, 2012, pág. 64-65.
Cassiano afirmava a doutrina do pecado
original na qual o homem é decaído em Adão. Porém, ele defendia que a vontade
não foi destruída e o homem não é moralmente impotente de forma completa, ou
seja, para ele, mesmo depois da queda, o homem ainda pode buscar a Deus.
Para Cassiano a vontade humana foi mutilada
pelo pecado, mas uma certa liberdade permaneceu nela.
Por causa disso, o homem
é capaz de se voltar para Deus. O pecador não está morto, mas ferido. A graça
não opera a salvação, mas coopera com a decisão do homem de buscar a Deus.
Ao contrário de Pelágio, Cassiano insistiu que
a graça e necessária para a justiça. Essa graça, no entanto, é resistível. Porque
para ser efetiva, a vontade humana deve cooperar com ela.
“A graça de Deus
é a base da nossa salvação; cada começo deve ser traçado por ela, porquanto ela
proporciona a chance da salvação e a possibilidade de se ser salvo. Mas essa é
a graça exterior; a graça interior é a que se apodera do homem, aclara,
purifica, santifica e penetra tanto na sua vontade quanto na sua inteligência.
A virtude humana não pode crescer nem ser aperfeiçoada sem essa graça — logo,
as virtudes dos pagãos são muito pequenas. Mas o início das boas
decisões, bons pensamentos e fé — entendidos como a preparação para a graça —
pode ser devido a nós mesmos. Consequentemente, a graça é absolutamente
necessária para alcançarmos a salvação final (perfeição), mas não tanto para
dar a partida. Ela nos acompanha em todos os estágios do nosso crescimento
interior, e as nossas manifestações não são úteis sem ela (libero arbitrio
semper co-operatur); mas ela apenas apoia e acompanha aquele que
realmente se esforça... mesmo essa... ação da graça não é
irresistível”.
Adolph Harnack, History of Dogma, parte 2,
livro 2, trad. por James MilIar (1898: Nova York: Dover, 1961), p. 247 in R. C. Sproul. Sola Gratia; traduzido por Denise Pereira
Ribeiro Meister. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, pág. 66. (grifos nossos)
Principais doutrinas do semipelagianismo:
- O homem caído
ainda tem condições de buscar a Deus;
- A graça de Deus
pode ser resistida pelo homem.
A pergunta principal que diferencia o
semipelagianismo e o agostinianismo é: Quem dá o primeiro passo para a
salvação, o homem ou Deus?
Para os semipelagianos: o homem
Para Agostinho: Deus
“Em oposição a
ambos os sistemas [pelagianismo e agostinianismo], ele [Cassiano] pensava que a
imagem divina e a liberdade humana não haviam sido aniquiladas, mas apenas
enfraquecidas pela queda; em outras palavras, que o homem estava doente mas não
morto, que não podia, de fato, ajudar-se, mas podia desejar a ajuda de um
médico e aceitá-la ou recusá-la quando oferecida, e que ele devia cooperar com
a graça de Deus na sua salvação. À questão sobre qual dos dois fatores tem a
iniciativa, ele responde de forma completamente empírica: que algumas vezes, e,
de fato normalmente, a vontade humana, como nos casos do Filho Pródigo, Zaqueu,
do Ladrão Penitente e de Cornélio, orienta-se para a conversão; algumas vezes a
graça a antecipa e, como com Mateus e Paulo, retira a vontade resistente —
porém, mesmo nesse caso, sem coerção — a Deus. Aqui, consequentemente, a gratia praeveniens é manifestamente
negligenciada.”
Philip Schaff, History of the Christian Church,
8 vols. (1907-10; Grand Rapids: Eerdmans, 1952-53), 3:861 in R. C. Sproul. Sola Gratia; traduzido por Denise Pereira
Ribeiro Meister. São Paulo: Cultura Cristã, 2012, pág. 68.
“O problema dos
semipelagianos foi ensinar que a natureza humana, de si mesma, podia dar o
primeiro passo em direção a Deus (initium fidei ou fé inicial). Em
outros termos, eles opinavam que o ser humano é salvo somente pela graça de
Deus, mas esse processo começa com a iniciativa de uma boa disposição do
coração humano para com Deus.
A declaração mais
famosa e controvertida de Cassiano foi aquela em que, na sua obra Conferências,
ao referir-se ao princípio da boa-vontade para com Deus, ele disse que Deus
aumenta “aquilo que Ele mesmo implantou ou que percebeu ter nascido de nosso
próprios esforços.” Seus adversários agostinianos, como Próspero de Aquitânia,
alegaram com razão que isso não era muito diferente do pelagianismo.
Em síntese, o
semipelagianismo é a idéia de que a natureza e a iniciativa humanas, por si
sós, sem a graça sobrenatural auxiliadora, são capazes de provocar a resposta
de Deus no sentido de conceder a graça salvífica.”
Herminstein Maia
Pereira da Costa. Fundamentos da Teologia Reformada. São Paulo: Editora Mundo
Cristão, pág. 95, disponível em: http://books.google.com.br/books?id=_u6isxgndmoC&pg=PA94&lpg=PA94&dq=semipelagianismo+e+a+igreja+catolica&source=bl&ots=Q5xQppo2cP&sig=zIORJ5Rp4b_vIgWGZ7KqJMxukMQ&hl=pt-BR&sa=X&ei=v3VCVMOfBY-7ggTe54HIDQ&ved=0CEUQ6AEwBw#v=onepage&q=semipelagianismo%20e%20a%20igreja%20catolica&f=false.
Acessado em 18 de outubro de 2014.
O SÍNODO DE
ORANGE (529)
O debate entre os defensores de Agostinho e de
Cassiano espalhou-se pela Europa e atingiu seu clímax no Sínodo de Orange, que
condenou o semipelagianismo.
“Em Orange, os
bispos católicos condenaram os principais aspectos do semipelagianismo,
endossaram o conceito que Agostinho tinha da necessidade e total suficiência da
graça e condenaram a crença na predestinação divina para o mal ou para a
perdição. Como Agostinho nunca chegou a afirmar especificamente que Deus
predestina alguém ao pecado ou ao inferno, seus próprios ensinos passaram pelo
Sínodo de Orange sem serem em nada criticados, mas também sem serem plenamente
confirmados. O sínodo não defendeu a predestinação de nenhuma forma.
Entretanto, exigiu a crença que qualquer ato de bondade ou retidão dos seres
humanos é resultado da graça de Deus que opera neles.
A teologia
católica ortodoxa, a partir de então, incluiria as idéias de que a graça de
Deus é a única origem e causa de todos os atos de retidão humana e que os
homens não são capazes de realizar obras merecedoras da salvação sem a graça
auxiliadora. Todavia, como o Sínodo de Orange deixou em aberto a questão da
livre cooperação humana com a graça, a Igreja Católica passou a incluir e
enfatizar um sistema de obras meritórias que são necessárias como credenciais
de graça e isso se reverteu a favor de um tipo de sinergismo no qual o
livre-arbítrio precisa cooperar com a graça para que a salvação chegue à
consumação perfeita”.
O Concílio de
Orange. Traduzido por: Felipe Sabino de Araújo Neto, Cuiabá-MT, 15 de março de
2004. Disponível em: http://www.monergismo.com/textos/credos/orange.htm.
Acessado em 18 de outubro de 2014.
“Essa
controvérsia foi encerrada em 529 pelo Sínodo de Orange, no sul da França, que
condenou os principais aspectos da teoria semipelagiana, afirmou o conceito
agostiniano da necessidade e total suficiência da graçae condenou a crença na
predestinação para o mal ou para a perdição. Com seu agostinianismo atenuado, o
sínodo insistiu que todo ato de retidão dos serem humanos é resultado da graça
divina que neles atua; no entanto, deixou em aberto a questão da livre
cooperação humana com a graça. Toda a ênfase foi colocada na graça dada no
batismo.
Com isso a Igreja
adotou na prática um tipo de sinergismo em que o livre-arbítrio precisa
cooperar com a graça para que a salvação se complete. Apesar de oficialmente
condenado, o semipelagianismo tornou-se a teologia popular mais aceita por
grande parte do catolicismo medieval, com sua ênfase em obras meritórias e no
sistema penitencial, que remontava ao século III com Cipriano de Cartago.”
Herminstein Maia
Pereira da Costa. Fundamentos da Teologia Reformada. São Paulo: Editora Mundo
Cristão, pág. 95, disponível em: http://books.google.com.br/books?id=_u6isxgndmoC&pg=PA94&lpg=PA94&dq=semipelagianismo+e+a+igreja+catolica&source=bl&ots=Q5xQppo2cP&sig=zIORJ5Rp4b_vIgWGZ7KqJMxukMQ&hl=pt-BR&sa=X&ei=v3VCVMOfBY-7ggTe54HIDQ&ved=0CEUQ6AEwBw#v=onepage&q=semipelagianismo%20e%20a%20igreja%20catolica&f=false.
Acessado em 18 de outubro de 2014.
Fundamentos bíblicos para refutação do
semipelagianismo:
A alma que pecar, essa morrerá (...). Ez 18:20
Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo
pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos
pecaram. Rm 5:12
porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a
vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor. Rm 6:23
Fui buscado pelos que não perguntavam por mim; fui achado por aqueles
que não me buscavam; a um povo que não se chamava do meu nome, eu disse: Eis-me
aqui, eis-me aqui. Is 65:1
(...) Ao Senhor pertence a salvação. Jn 2:9
Estou plenamente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de
completá-la até ao Dia de Cristo Jesus. Fp 1:6
porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar,
segundo a sua boa vontade. Fp 2:13
Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós, é
dom de Deus. Ef 2:8
Porque sem mim nada podeis fazer. Jo 15:5
Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres. Jo 8:36
O homem não pode receber coisa alguma se do céu não lhe for dada. Jo
3:27
QUADRO COMPARATIVO SOBRE DOUTRINAS
HISTÓRICAS
|
|||
DOUTRINA
|
PELAGIANA
|
AGOSTINIANA
|
SEMIPELAGIANA
|
PRINCIPAIS DEFENSORES
|
Pelagio, Julião de Eclano,
Celéstio
|
Agostinho de Hipona
|
João Cassiano
|
VISÃO SOBRE HOMEM
|
A natureza humana é inocente e pura,
o homem nasce sem culpa ou pecado, é uma criatura perfeita.
|
A natureza humana é pecaminosa, o
homem por si só não é salvo, depende única e exclusivamente de Deus.
|
A natureza humana é pecaminosa, mas o
homem que buscar encontrará Deus.
|
VISÃO SOBRE O PECADO
|
O homem não é pecador por natureza,
ele a capaz de viver sem pecar. O pecado de Adão não afetou seus
descendentes.
|
O homem nasce pecador como
consequência do pecado inicial de Adão.
|
O homem nasce pecador como
consequência do pecado inicial de Adão.
|
VISÃO SOBRE O BATISMO
|
O homem é inocente, não necessita do
batismo. O batismo serve apenas para o homem se unir com Jesus Cristo.
|
O batismo representa a limpeza do
pecado realizada por Deus.
|
O batismo representa a limpeza do
pecado realizada por Deus.
|
VISÃO SOBRE A GRAÇA DE DEUS
|
A graça não é essencial para a
salvação, ela apenas auxilia o homem. A recompensa de Deus é fruto natural do
esforço do próprio homem.
|
A graça é essencial à salvação e é
dada por Deus apenas aos eleitos. Após a conversão, ela é o instrumento que
mantém o homem afastado do mal, pois sem ela o homem é fraco e cairá novamente.
|
O homem dá o primeiro passo em
direção a Deus. A graça é alcançada segundo o esforço do homem em fazer o bem
e seguir a vontade de Deus.
|
VISÃO SOBRE A SALVAÇÃO
|
Única e exclusivamente do homem. O
homem realiza a sua escolha.
|
Deus escolhe o homem segundo a sua
vontade. Somente os eleitos serão salvos.
|
O homem dá o primeiro passo em
direção a Deus, e só então Deus age com graça e concede a salvação.
|
- Principais
doutrinas do semipelagianismo: o homem caído ainda tem condições de buscar a
Deus; a graça de Deus pode ser resistida pelo homem;
- Quem dá o
primeiro passo para a salvação? Para os semipelagianos é o homem; para
Agostinho é Deus;
- A doutrina da
graça defendida por Agostinho é a única verdadeiramente bíblica e que reconhece
que toda a glória pertence a Deus (Soli Deo Gloria).
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